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11.6.10

Métodos para o status de rato

Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete e ooiitoo... “Faz um pouco mais fechado na próxima”. “Não deixa tua coluna ir pra frente”. “Só faz mais duas séries e parte para outra”. Recomendações de um especialista no assunto, o educador físico. Musculação é um ótimo esporte. O maior desafio para conseguir praticar esse esporte é aguentar os usuários, os chamados ratos de academia. São pessoas muito simpáticas, espontâneas, felizes, brincalhonas, palhaças, babacas, idiotas, narcisistas...
No mundo dos marombeiros, quem ganha destaque é o frequentador diário, que se exibe, em todos os sentidos, e quem puxa mais peso. Quem luta por conhecimento e carreira não consegue ganhar destaque dentro desse mundo. Isso por que sucesso profissional, ou qualidades intelectuais não são levados em conta. A meta é ser desleixado, espontâneo e não se preocupar com os outros.
Ao tentar se passar por um rato de academia algumas situações são fundamentais. Primeiro: a mensalidade deve estar em dia, se não fica muito chato. O pessoal te chama de caloteiro, tá ligado! Segundo: Teu treino mostra o quanto você é bom. São quatro exercícios para cada grupo muscular e cada grupo muscular tem que ser trabalhado duas vezes por semana. Terceiro: Roupas. Quem disse que malhar deve ser feito com roupa velha e tênis sucateado. A roupa é um instrumento que faz jus ao teu nome dentro da academia. Os outros ratos são como mulheres em uma festa chique, se vestem para serem vistos e elogiados. Quarto: O exibicionismo é imprescindível. Mostra-se, ouse-se, levanta essa camisa na frente no espelho, e compare seus músculos com o dos outros ratos. E quinto: Deixe todo o material usado espalhado. Não fique desmontando os pesos, Faz o teu e o resto que se vire.
Teorizar esses aspectos é fácil o problema foi colocá-los em prática. Agora chegou a parte boa, se comportar como um marombeiro. Antes de sair de casa, a roupa para ser trocada no vestiário é tratada com delicadeza. Afinal não se vê ratos com roupas amassadas. Ao chegar à academia, percebi que pratiquei um erro. Nenhum dos integrantes do grupo de marombeiros se vestia na academia. Eles chegavam já com a roupa, no estilo surfista, por baixo de um casaco ou moletom, de marca. A ideia do vestiário é só para dar uma olhada no visual, dar uma mijada, lavar as mãos (nem sempre) e partir para a briga. Bom no outro dia eu não iria errar.
A roupa não é confortável para malhar. As camisas apertadas são sufocantes dando uma sensação de estrangulamento. Mas há aqueles que usam camisas mais largas. No entanto, esses são iniciantes. A proposta é ser o cara. Os tênis novos, mais para sair, ficam soltos e faz tu caminhar mais estranho. Os calções são muito largos. Para praticar esporte com isso não dá! Mas vamos lá. Para aquecer uma pequena corridinha. A merda começa por ai, mas pelo menos, logo na entrada já levei umas olhadas. Até parece um baile gay!
A corrida é ao som das tamancas, parece flamenco. É pior do que marcha militar. Os tênis duros não deixam sentir a leveza e o prazer de uma corrida ideal. Os calções também te atrapalham. Movendo-se como cortinas ao vento. A camisa só deixa mais evidente o teu suor, mostrando que você está lutando pelo seu destino.
Dez minutos se passam e você está exausto. Você ainda tem mais dez minutos pela frente, e não consegue nem mais correr sem se desequilibrar. O puta merda da esteira entra em cena. Agora entendi por que alguns bombadões ficavam se segurando. Mas o céu é o limite e o tempo foi alcançado.
É provável que a roupa ajude muito na queima de calorias. O cansaço é muito maior do que quando praticado com roupas adaptadas para exercícios físicos. Bom, vamos para os pesos. Ou melhor, vejo tudo retorcido, acho que não vou nem conseguir pegar alguma barra, ou alteres. Fui para o descanso. Algo que nunca imaginei fazer. Sempre saia do treino aeróbico e ia direto para a malhação.
No descanso notei que as inter-relações entre os seres são próximas. Suas rotinas alimentares, diárias e de descontração são colocadas em público. Algumas coisas são... interessantes. São fatos relacionados ao fim de semana, futebol, mulher, futebol, o filme novo de luta, futebol e culinária. É culinária mesmo. Os brutos também são grandes chefes de cozinha. Acompanhe:
- (O apelido do ser é monstro): Meu seguinte ontem comi dois ovos, quatro cacetinhos integrais, muita salada. Fiz uma batida fera para comer com o pão. Peguei as cascas dos ovos, banana, leite, farinha de amido e bati tudo. Muito bom tem todas as proteínas e vitaminas. Hoje de manhã me acordei meio mal da barriga, mas agora to legal.
“Será que alguém dormiu com ele?” (a pequena história do intelectual da culinária de crescimento não seria tão engraçada sem a característica do tom de voz dele. Infelizmente não existe malhação para mudar o timbre. A voz do magrão era fanha e desengonçada. Voz de babicão).
Depois de ouvir os toques culinários do monstro fui treinar. O aumento dos pesos deve ser gradual. O tempo que tu vai ficar fazendo aquele exercício não importa. O importante mesmo é conversar. É conversar, a academia é um local de conversas. Viagens à Rivera, mulher, contrabando e pirataria, “pequei todas nesse findi”, suplementação, “tá ligado na Cásia do banco Sicred?”, shows, “levei ela pra casa”, balada, “depois da psy” - e é claro - futebol. Nessa hora o assunto da Cásia não importa mais. Se comeu ou não comeu? Tanto faz. A onda nessa hora é mostrar quem sabe mais sobre os últimos jogos da rodada e também fazer um remake.
Juro que tentei. Mas eu não conseguia decorar os zilhões de jogadores que eles se relembravam. Mal consegui decorar quem joga no internacional e no grêmio. Nesse ponto levei locaute. Mas pelo menos meu treino de peito já terminou. E é claro não desmontei a barra do supino. Deixei esse trabalho para um alemãozinho novo aspirante a marombeiro.
Fui para o treino de bíceps. Principal músculo do organismo marombeiro. Não foi possível competir com a carga desses caras. Mas utilizei o artifício do estilo. Faz, para, conversa, bebe uma água, faz mais uma série, bebe mais uma água, vai ver a aula de taiko-do, faz outra série... E dessa maneira se chega ao final do treino de bíceps com pesos razoáveis.
Cometi mais um erro na finaleira. Fazer abdominais. Todos matam essa fase. Mas eu fiz afinal a tendência de ficar barrigudo é grande. Na hora do abdominal parece que há uma ajuda mútua de todos. É o último exercício então todo mundo relaxa mesmo.
A gordinha do fundo está aqui todos os dias. A maneira como ela faz o abdominal é como se fosse uma selvagem. Seu rosto se enche de raiva. Suas têmporas se abrem. Mas os seis e a barriga atrapalham a subida. A rapidez assusta o instrutor que sugere:
- Faz um pouco mais esticado e devagar;
A reclamação é imediata: “AH, mas não pode ser assim?”.
- Assim tu não vai trabalhar nada.
- Mas eu faço assim todos os dias.
Bom nessa hora eu tive que parar de olhar. Depois da olha do Instrutor para mim tive que virar a cara para o outro lado. Daí ele soltou:
- É por isso que não adiantou até agora.
Não pude ver a expressão do rosto dela. Estava olhando para o outro lado me segurando para não rir. Mas sua voz foi ríspida, suave e formal.
- Então eu tenho que esticar a minha coluna e subir até onde eu consigo?
Dei uma olhada para verificar os ânimos. Ela estava fazendo do mesmo jeito. E o instrutor tentando corrigi-la. Junto com essa cena os meus abdominais foram alcançados. Mas ainda precisava fazer cintura. Bom deixa prá lá, nunca vi ninguém fazendo cintura.
Depois de uma semana inteira agindo como um babaca eu tive que parar. Afinal há outras coisas para se preocupar. Um exemplo é escrever esse texto. A chacota de tudo isso é que no fundo muitos de nós gostaríamos de ter um corpo de um rato de laboratório desse meio. Não conseguimos alcançar esse milagre por vários motivos. Um deles é pelo amor ao jornalismo. Essa arte de ser jornalista nos transforma em seres superiores. Na verdade não me sinto nem um pouco superior. Minha inferioridade é tamanha que me vejo pior do que esses caras que analisei.
O meu texto é peso pena nesse mundo dos jornalistas. Minha quantidade de livros lidos é não é nem um pouco pesada. Percebo que há pessoas que lê bibliotecas semanalmente. E eu, leio humildemente um livro em duas semanas. Minhas roupas são fora do padrão Famecos, muitas vezes. O desfile de modas e de marcas são prazeres que não se encaixam no orçamento. Estar ligado em tudo que acontece no mundo é muito difícil para quem tem uma leve lembrança. Mesmo lendo os jornais diariamente e comentando esses assuntos com meus colegas de trabalho a quantidade enorme de informação municipal, estadual, federal e mundial é muito grande.
Enfim a vida é assim! Queremos atingir status e metas distantes demais para nossa realidade. A inferioridade atinge até mesmo aos grandões da academia. Afinal a frase deles é: “Meu, quero ficar três vezes maior do que isso”. E eles, a cada mês que passa, incham mais e mais e continuam dizendo a mesma frase, diariamente.
Alexandre 1 Soares 2 Pinto 3

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